terça-feira, 30 de novembro de 2010

Atrás do portão amarelo

Eu ainda consigo sentir o cheiro, o cheiro quente dos dias de verão. Quando a água azul ainda me olhava como se fosse minha. Posso sentir sob o meu pé, o chão de cimento fervendo com o calor do sol.

Está tudo tão igual e tão diferente. Sinto os mesmo cheiros, ouço os mesmos barulhos. Eu poderia dizer meus cheiros, meus barulhos, mas agora tão distantes, já não são mais meus.

Estou diante da casa vazia, que já não é mais lar. São minhas coisas, que não são mais minhas. É tudo tão meu que chega a doer, chega a me dar enjôo sentir meu cheiro nessas roupas. São sapatos que não uso, fotos que não vejo mais. Não é mais minha cama.

De mim só ficaram as coisas, as lembranças. Consigo me ver descer correndo para almoçar, posso me ver nadando e subindo no pé de amora. Não sou mais eu ali.

É a minha alma que caminha entre as portas. E eu deixei pra trás, na casa que não tem mais almoço, não tem mais rede, não tem mais graça.

Na casa ainda tem teto, tem parede, tem cor. Tem o vento de tarde, tem o sol na varanda pela manhã. Ter tudo e não ter nada, dói.

Dói deixar pra trás, e dói voltar sem estar ali completamente. O sol ainda se põe na mesma hora, no mesmo lugar, atrás da mesma árvore. Ainda está tudo ali, e a única coisa que consigo fazer é fechar o portão amarelo, e deixar aquilo onde está. Porque voltar não posso mais.

domingo, 28 de novembro de 2010

Ponto final

Tudo sempre tem um fim. Os finais não avisam quando chegam, eles chegam devagar, sem deixar rastros ou abrir caminhos. Você se distrai por uns minutos, meses ou anos, e quando vê está ali diante de você. Escancarado, pra quem quiser ver.

Um dia o presente vira passado. A rotina vira lembrança, e a saudade chega pra te avisar. Você trocou de amigos, de roupas de amores. A cidade continua a mesma, as ruas também, os carros, estes sim estão diferentes. Você está diferente, e pra você a cidade está muito diferente. Assim como os carros, e as pessoas também mudaram.

Você custa a aceitar, até outro dia você via aquela amiga todos os dias. Hoje você acha que foi com ela que você trombou no supermercado.

Por que um dia você vai encontrar com aquele amigo de anos, que jurava ser seu amigo de infância. Aquele amigo que você sabia de cor o nome e sobrenome dos avós. Daqueles amigos que os três gatos eram como seus, e você tinha até colocado o nome em um deles.

Nesse dia vocês vão se encontrar, e se reconhecerem já será um grande alívio. Você vai perguntar dos avós. Talvez ele te pergunte de seu irmão, e daquele cachorro que morreu há uns três anos. Mas você não vai ter lembrado o nome dos avós dele, vai ter esquecido a raça dos gatos, e talvez nem tenha a certeza se eram realmente três gatos. Talvez fossem quatro ou cinco. Não importa, você achou ele um chato mesmo.

É nesses dias que você consegue visualizar o fim. Fim de uma década, fim de uma amizade, talvez. Quem sabe nunca foi mesmo uma amizade. Finais são assim, inevitáveis, e fracos diante da força do tempo. E são muito mais comuns em nossa vida, do que queremos mesmo acreditar. Talvez por isso nos causem tanto medo.

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Padrão

Nós mulheres temos o dom de padrões. Decidi acreditar nisso depois que li algumas coisas realmente conclusivas, sobre idiotices femininas. O que acontece é que nosso padrão feminino, teima em complicar tudo. Teima em achar que o fulano é diferente, que ele não vai fazer igual, mas vai.

Nós estúpidas e idiotas mulheres temos um padrão complicado. O padrão de perguntar pra amiga no dia seguinte, se A quis dizer B, e se X é mesmo o Y que entendemos.

No fundo a gente sabe que não é. Sabe que A, é A e ponto final, e ele não veio com o B pra fazer parzinho. E o X nunca vai chegar no Y, por que são coisas completamente diferentes.

A gente insiste, vai atrás. Compara comunidades, vê amigos em comum. Lê todos os resultados de testes feitos nas redes sociais nos últimos meses. Faz combinação de signo e jura que ele é Touro, mas nem é cabeça dura.

É um padrão idiota, mas a gente só assume isso quando ele passa. E aí é quando o padrão masculino entra em ação. Vocês deveriam patentear esse radar de aparecer quando são esquecidos. É um sexto sentido que nem o nosso que é super apurado, consegue captar. Sinceramente, homens também são padronizados. Vocês só não deixam nunca transparecer.

Dados indicam que um encontro é normal, dois são coincidência, e quatro um padrão. Claro, óbvio, que isso foi coisa de homem. E sim, foi. Por isso quatro encontros, é uma sentença proibida em determinados grupos masculinos. E olha, que talvez, eles mesmos nem saibam disso.

Padrões masculinos não se resumem a complicar as coisas, mas a fingir que elas não existem. Desses padrões muitas vezes as coisas passam a nem existir. Por que encontros são proibidos, padrões são proibidos. Pra que isso tudo então? Por que complicar tudo?

E essa pergunta é pra homens e mulheres.

É tão simples, se não vai ligar no dia seguinte, não pede o celular. Se não quer nada sério não vai fuçar a ex dele. Se for pra adicionar no MSN e não ter assunto, não adiciona. Ele é um chato no twitter, você não precisa dar f5 a cada dez minutos pra descobrir isso.

Infelizmente padrões são assim, eles surgem da história. Ninguém sabe quando foi, até por que as mulheres das cavernas não tinham orkuts para fuçar. E homens não podiam pedir telefones, e não ligar no dia seguinte. Mas os padrões estão aí, e vão continuar sendo seguidos, mesmo que lutemos contra eles. No fim, somos todos uns idiotas padronizados que só sabemos complicar tudo quando se trata do sexo oposto, e ponto final.

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Post It




Outro dia me deixei um bilhete. Peguei o rosa mais choque dos post its que achei, escrevi de caneta preta grossa, com a letra mais bonita que consegui depois das 30 tentivas. Está lá, me olha todos os dias pela manhã quando saio.

Neste dia o porteiro meu deu o bom dia de sempre, com a cara de sempre. Vi a mesma moça que sempre está naquela esquina esperando alguém. O padeiro ali, entregando o saco de 3 pães pra senhora simpática. A caixa lixando a unha até a senhora chegar, a mesma caixa de todo dia. O mesmo ônibus, no mesmo horário. As mesmas pessoas, as mesmas árvores, folhas e calçadas quebradas. Um dia comum, como qualquer outro. Carros andando, folhas caindo, chuva caindo. E a chuva tem sido a única diferença entre hoje e ontem.

Continuei cansada das mesmas pessoas, mesmas comidas, mesmos programas. É tudo tão igual, tão semelhante que chega parecer tudo a mesma coisa. Essa situação está tão implícita em mim, que começo a me achar igual demais. Estou mais cansada de mim, do que da vizinha chata, que pra mudar meu dia, resolveu me contar sobre a artrite. Está faltando algo, dias de verão que andam cinzas. Que são mais frios que dias de inverno.

A velha máxima do ter tudo, e não ter nada. O velho caso de estar no meio da multidão e estar sozinho. Não vou culpar o mundo capitalista, ou o pensamento pós moderno por isso. Vai ver, é culpa minha mesmo, de me habituar, de me cansar, de me acomodar.

E mesmo com toda a vontade de correr, de fugir, de gritar, continuo seguindo a mesma rotina, os mesmos hábitos, vendo as mesmas pessoas. Mesmo sabendo que no espelho do meu quarto está o meu bilhete rosa choque, pra me lembrar do que eu realmente quero pra mim.