sábado, 4 de dezembro de 2010

Querida Paixão,

Resolvi escrever essa carta por que temos que conversar. Há muito tempo venho juntando dados, pra te dizer com provas, o que realmente acho de você. Desde os meus 5 anos você resolveu me atormentar, mudar meus comportamentos e decidir por mim o que eu deveria fazer. E sinceramente, 15 anos de convivência é muito tempo.

De alguma maneira nesse tempo eu tive de aprender a lidar com você. Até mesmo porque você não faz nenhum esforço para ser agradável. No nosso primeiro contato já foi assim.

Meu coleguinha de sala, que eu brincava, me divertia e ria das piadas, virou o cara mais lindo da escola. E eu virei uma idiota. Não brincava, não me aproximava mais, e ainda tinha vergonha de rir das piadas dele.

Pra que isso? Eu tinha 6 anos, e você já me traumatizou.

Depois disso as coisas só pioraram, por que um dia eu sentia minha barriga embrulhando, meu coração disparando e eu sabia que era você que tinha vindo me visitar. Daí o amigo virava amor, o professor um Deus, e o desconhecido do prédio ao lado passava a ser o sentido da minha vida.

Enquanto eu lidava sozinha com meus amores de contos de fadas. E me iludia diariamente sob a sua influência, até consegui aturar a sua presença. Você não costumava ficar por muito tempo, e se ficava, mudava bastante de foco.

O nosso grande problema foi quando você resolveu ser real e presente. Parou de mudar só meu olhar pelas coisas e pessoas, começou a mudar mais o meu comportamento, e na maioria das vezes começou a me trazer dor.

Nessas horas a gente briga. Eu falo pra você o quão idiota você é, e até assumo minha culpa nisso. E você vai embora. Eu não sei se sou eu ou você a culpada pela minha inconstância, talvez seja uma coisa mútua, eu me canso de você e você de mim. E quando bate uma saudade você volta a me visitar.

Na maioria das vezes você bem que tentou permanecer por um certo tempo, mudava minha rotina, meu jeito de ver as coisas, mas um belo dia você sumia. Nessa hora não foi só comigo que você atrapalhou tudo. Não podia ter dado um aviso prévio? Ir embora assim, sem avisar, deveria ser proibido.

Sofrer por sua falta às vezes dói mais do que quando você está por aqui. Dá certa culpa, uma sensação de; “como isso e aquilo aconteceu comigo?”. Uma impotência irremediável.

No fim das contas eu sei que não consigo ficar muito tempo sem você, sei tão bem que já me peguei te inventando, só de saudade. Acho mesmo é que estamos um pouco desreguladas, funcionando em fusos horários diferentes. Por que você não pode me ouvir, e chegar mais perto quando preciso de você?

E por que quando digo que você não será bem vinda, você já se instalou, guardou suas roupas em um armário e criou raízes dentro de mim?

A gente deveria se respeitar e não brigar. Você é parte de mim, sabia?

Enfim, sei que você não está gostando das medidas que estou tomando quanto a sua presença em minha vida, mas elas são necessárias. Nosso tempo de convivência me fez perceber isso. Não estou querendo passar pelas armadilhas que você me colocou um dia.

Dizem que errar não é burrice, mas persistir no erro sim. Portanto escrevo para te avisar, as coisas estão mudando. Eu não vou mais ficar sozinha com você, ando racional demais para sua influência. Seu lugar continua aqui, está limpo e muito bem cuidado, mas agora ele tem chave. Então não pense que vai poder chegar ou sair assim, sem avisar.

Agora quero respeito quando eu disser que não te quero por perto. Assim como vou respeitar que por mais que eu queira, você pode querer não aparecer. Vamos deixar as coisas assim agora? Em um nível de convivência agradável, onde meus parâmetros sociais possam conviver em harmonia com as loucuras que você adora me meter.

Talvez eu esteja sendo racional demais, mas de que adianta? Daqui uns dias essa carta vai ser só mais um papel pra você jogar no fogo que você acende quando chega.


Saudades.

Um comentário:

  1. Júlia, parabéns por esse texto fantástico e tão real! Acho que todas nós temos esse 'relacionamento' com a paixão mas nem sabemos como lidar, e vcc conseguiu colocar exatamente o que ela faz, mas mais do que isso...o que devemos fazer!
    Amei cada pedacinho.=)

    BeijO.

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